22/07/2008

Diarios de um sintoma inadaptado. O dia seguinte

O último prato aconchega-se á rack junto dos outros pratos todos.
Aqueles que não pararam de olhar para mim enquanto os lavei. A falarem. A julgarem-me.
E os copos, com os logotipos do hotel..todos me gozam. Todos me olham. Todos me julgam.
Mas.. acorda pá!!
São só copos e pratos meu! Copos e pratos.
Não tem piada enfiar a faca num copo.
Não atravessa. Não passa. Muito menos num prato. Num prato!?
Pensamentos ridiculamente divertidos te passam na cabeça agora.
Agora está bem.
Agora até me divirto com o bocado seco de fiambre de um prato que veio do "room service", e que já cá devia ter aparecido ainda antes de eu ter ido de férias, o ano passado.
Agora está bem. Agora até nem me importo com a gorda da minha chefe. Ou se calhar..
Gorda nojenta.
Não consegues perguntar se posso ir jantar mais cedo que o costume sem elevares os decibeis ao nivel de um aeroporto, inutil forma de vida?
Espera.
Isto sim. É o verdadeiro pedaço de carne. Aquele mesmo. O que preciso agora!
Como seria atravessar-lhe a lâmina pelos 92 quilos de gordura vomitante dentro?
Diz-me lá gordura vomitante..
Será que as tuas cordas vocais iam ter força suficiente para se expelirem em rasgos de sobrevivência, ou simplesmente ias desfalecer como o nobre nojento do brazuca?
Grita comigo. Vá lá!
Quanto mais fazes valer a tua insípida chefia, mais eu quero que me mandes lavar os talheres. Por favor? Deixas?
Manda-me lavar os talheres. Vá lá..pica-me!
Já não tenho faca. E preciso de uma.
Que loucura! Loucura!
Gorda nojenta.. Até perdi a fome. Acho que nem vou comer.
Não concordas? O quê? Queres que vá lá para baixo á mesma para não te acusarem de nada?
Típico.
Ok.
Vou lá para baixo.
Mais baixo também não posso descer. Mas subo na ansiedade de ver como vais reagir quando te faltarem dois centimetros para morrer.
Levo a faca que tanto anseio enterrar...enterrar não! Penetrar?
Merda..penetrar também não. Faz-me lembrar nojentos fornicadores. Almas perversas e palermas que organizam a vida em prol da cona ou do caralho alheio.
Como explicar então, á lei da justa laminada ao, se é que lhe posso chamar assim, corpo da minha chefe?
O cigarro que fumo á porta dos balnearios não me sabe responder.
O colega que se aproxima de mim tambem não o vai fazer.
Nem quero.
Nem boa noite me diz.
Pena que me sejas tão indiferente, mas tão indiferente caro colega, que a essa tua exagerada indiferença tornou-se na tua principal diferença. Nunca te irei tocar.
Passou a meia hora de jantar. Fumei que nem uma besta.
Não comi. Não consigo.
Nunca quis tanto ver 92 quilos de gordura vomitante como agora.
Extâse. Total!
Ò perfeitamente agoniante visão! Ainda agora chegaste e já me estás a dar ordens? Ainda agora entrei.
Que bom!
Cada ordem dela, um grito.
Cada grito dela, um sorriso meu.
Cada sorriso meu..outra ameaça dela.
E que bonitos me parecem os talheres.
Alheio-me do mundo, como tão bem quero fazer. Concentro-me na beleza de uma faca de sobremesa. Esta merda não corta!!
Dificil furar alguem com isto. Lindo!
Meia duzia de nódoas negras até a pele dar de si.
Aquela pele grossa e esticada.
Isso ia dar espaço para as cordas vocais dela se apresentarem ao mundo.
Ai. Não posso.
Olá faca de carne. Foi uma irmã tua que deitei ontem ao rio. Como te chamas? Não respondes? És como a merda de mulheres todas que conheci na vida. Estou a ser simpatico contigo, lavo-te, seco-te e levo-te a passear á noite. Uso-te, ainda te faço a maquilhagem, um vermelho vivo, e tu não me ligas nenhuma á mesma.
Caguei.
Levo-te.
Levo-te á mesma!
Vamos fazer amor os 3 hoje á noite.. eu, tu e a gordura vomitante!
Por falar nela..
Como?
Porque raio estou parado á mais de cinco minutos a lavar a mesma faca?
PORQUE TALVEZ JÁ ESTEJA HÁ CINCO MINUTOS Á ESPERA QUE CHEGUES AO PÉ DE MIM PARA TE ESPETAR ESTA MERDA, GORDA NOJENTA!!!
Como?
Como? Sonho acordado! 92 quilos a gritar comigo enquanto pisco os olhos.
Sorriso amarelo..amarelo..
Já não dá para ter sorriso sequer.
Não consigo libertar argumentos com esta senhora! Fico-me por aqui agora.
Vou aliviar a ansiedade com o stress de uma fuga furtiva ao balneario para repôr os níveis de nicotina.
Primeiro bafo: Não posso matá-la aqui no hotel.
Vou acabar com o meu prazer ainda antes de ele ser prematuro.
Segundo bafo: Já tens a faca, falta pouco para a usares. Calma e paciência.
Terceiro bafo: se ela não me tivesse descoberto e não me estivesse a berrar aos ouvidos talvez tivesse dado o terceiro bafo.
Não é preciso falar assim. Ok. Ok.
E não pára de gritar!!!
Deixa-me, gorda de merda! Não vês que te estou a ignorar? Não vês que te viro as costas?
VOU GOSTAR TANTO, esbracejei enquanto aproximei os meus decibeis dos dela!
Silêncio.
Bolas! Calou-se.
Gorda nojenta.
A chama do isqueiro acende outro Ventil.
Olho para as horas. Vinte minutos para sair.
Vinte minutos para me libertar. A mim, a ela e á faca que já só se deixa tremer nas minhas ansiosas mãos.
Cada bafo no cigarro me lembra os gemidos do pedaço de carne da noite passada.
Mais um bafo. Mais um gemido. Mais um sorriso.
Ao longe a voz da gordura vomitante.
Atiro o meio cigarro para o chão e faço-me ao caminho da copa. Cruzo-me com ela.
Sim. Eu sei que tenho duas racks de pratos ainda para lavar mas...já se vai embora?
Vai?
Foda-se!!
Não gosto. Não quero. Não gosto!
Vai-se embora mais cedo do que a lâmina da faca na minha mão queria!
Não pode! Tens de esperar que eu saia também! Não vás minha gorduchinha vomitante linda!
Controla-te! Não transpareças na cara desilusão!
Volto ao balneario. A respiração não me perdoa e o coração a mil! Mas agora não é bom.
Panico! Panico puro! Tento aguentar a puta da lágrima. Lágrima?
O quê?
Pára de cair caralho!
Ès mais forte que isto!
Passos. Vem aí gente.
Não consigo disfarçar a raiva, tristeza, angústia, revolta e outros fodasses por não poder furar aquela merdosa nojenta hoje!
Mordo o lábio inferior.
Não chega.
Ouço a gordura vomitante passar á porta do balneario, pronta a viver um dia mais. Vai acompanhada.
Tiro a faca que, com tanto amor roubei das racks de talheres.
As lágrimas não páram de cair.
Merda. Merda. Merda!!!
Tenta arranjar solução em vez de estares aqui encostado ao tampo da sanita.
È isso.
Porra. È mesmo isso!
A lâmina no teu braço. Doce..liquido..sair...alivia.
Alivia tanto.
Foi pouco. Mas soube tão bem. Libertou- me da frustração de não furar a nojenta. Que bom. Antes dôr física que frustração mental.
E pinga no chão a razão.
E pinga no chão a razão.
E pinga..
Já vou caralho!! Já saio daqui! Merda para isto. Balneario tão grande e uma só sanita. Saio assim que limpar do chão aquilo que me pinta por dentro.
Não acredito. Mais um dia fútil. Mais um dia inútil.
Merda!
Saber que se afasta a fonte do meu prazer deixa-me revoltado.
À gorda do caralho!
Ainda por cima amanhã estamos os dois de folga.
Ao menos soubesse onde tu vives. Dançavamos os dois num total universo de sangue e prazer.
Mas espera. Não perdes pela demora.
Hei-de estar a rir-me qundo morreres ás mãos da minha faca com lamina cega. Sim. Hás-de levar com a faca de sobremesa.
Até já fiz a troca e tudo!
Lâminas afiadas? Agora não.
Não mereces.
Porque até eu vou estar cego quando te matar!

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